A FAMÍLIA MULTIESPÉCIE E A TUTELA DO ANIMAL DE ESTIMAÇÃO SOB A ÓTICA DA AFETIVIDADE ASSOCIADA À POSSIBILIDADE DE DESCOISIFICAÇÃO DA ANIMALIDADE
Resumo
O presente estudo se propõe a realizar uma reflexão sobre a composição da família multiespécie – cuja estruturação se perfaz através da conjugação da relação entre o animal humano e o animal não-humano – constituída simbolicamente pela afetividade, em paralelo ao movimento social da descoisificação da animalidade. Dessa forma, diante da asserção de que é plausível extrair da Constituição da República Federativa do Brasil (CF/88) o suporte para a aplicação do princípio mandamental da dignidade da pessoa humana às configurações familiares contemporâneas, nelas incluída a família multiespécie, é possível associar a concessão da tutela do animal de estimação à descoisificação da animalidade? De tal sorte, para respaldar possíveis respostas ao questionamento da pesquisa, pretende-se avaliar se a premissa de que a concessão de direitos aos animais de estimação pode modificar preceitos do Direito de Família o qual, por passar por transformações paradigmáticas e, também, estar envolto por uma normatividade principiológica, tende a ser um ambiente favorável ao aparecimento de novas estruturas familiares amparadas pelos princípios da dignidade da pessoa e da afetividade, servindo de precedente para novas modificações sociais e jurídicas. Ademais, almeja-se, por intermédio da interpretação sistemática do Direito Constitucional, Civil e de Família investigar a viabilidade da ampliação do alcance do Princípio da Afetividade nas relações familiares contemporâneas, ante a premissa biocêntrica da recente categoria relacional. Atenta ao movimento do bem-estar (welfare) e da senciência animal, a asserção da descoisificação similarmente intenta ilustrar uma nova discussão acerca da hermenêutica jurídica, por intermédio da subsunção principiológica e o reconhecimento da condição dos animais como seres “dotados de sensibilidade”. Busca-se demonstrar que a afetividade é corolária dos princípios da dignidade da pessoa e da solidariedade, ambos amparados constitucionalmente, e, em relação aos quais, a interpretação é estendida, por analogia, aos seres sencientes. O Direito de Família já assimilou – por intermédio da ampliação do alcance do Princípio da Afetividade – um fragmento do Direito Animal ao reconhecer os animais não-humanos como “membros” da família contemporânea, de modo que a alteração do seu status jurídico poderá ser uma consequência direta da constitucionalização do Direito Civil. A possível alteração do status de tutela do animal de estimação associada à descoisificação da animalidade pode ser justificada a partir de novos padrões familiares e exigências sociais de caráter subjetivo e afetivo, impondo-se a necessidade de medidas de reconhecimento judicial da família multiespécie para o bem-estar de todos.