DISCURSOS JURÍDICOS DE REPRESSÃO E DE LIBERTAÇÃO NO ESTADO NOVO

  • Lara Pastorello PANACHUK
Palavras-chave: Estado Novo, cultura político-jurídica, prospecção histórico-literária, dialogismo

Resumo

A presente pesquisa foi desenvolvida durante a graduação em Direito na Universidade Federal do Paraná, com orientação do Professor Doutor Luís Fernando Lopes Pereira. Objetivou-se, a priori, a análise sobre a circularidade da cultura jurídica em Curitiba e sua relação com o cenário nacional, durante o Estado Novo. Estruturou-se a pesquisa, metodologicamente, com fontes primárias, os arquivos do DOPS disponíveis no Arquivo Público do Paraná a fim de utilizar tais materiais para interpretar, de acordo com o paradigma indiciário de Carlo Ginzburg, atento aos detalhes e às minúcias, elementos fundamentais que possibilitem a reconstituição de uma certa realidade. Porém, ocorreu um salto de abrangência do campo da pesquisa com o estudo do prontuário nº 1.447, referentes às diligências do DOPS Paraná para busca e apreensão do livro A Mulata e assim, iniciou-se um diálogo da História do Direito com a Literatura. A referida obra, escrita por Carlos Malheiro Dias em 1896, produz audaciosas e virulentas críticas à sociedade brasileira do final do século XIX, sendo profícuo para compreender a percepção de um indivíduo perante as transformações do Brasil, possibilitando o estudo da cultura jurídica a priori através das lentes literárias que transpõe o leitor para os primeiros anos da República nacional. A polêmica obra não foi mal recebida apenas na época de sua publicação, mas também foi objeto de perseguição pelo Tribunal de Segurança Nacional, que, embasado pela Lei nº 431 de 18 de maio de 1938, considerou que o referido livro era uma ameaça à ordem social, por verificar conter em sua narrativa práticas de atos definidos como condutas criminosas. Deste modo, o Estado Novo visa ao controle do cenário artístico e intelectual, proporcionando, em meio aos limites da realidade, o desenvolvimento cultural de acordo com as diretrizes consonantes ao regime e tentando apagar os traços dissonantes, porém presentes, em meio à complexidade polifônica e dialógica dos discursos, conforme conceituação de Bakhtin. Ora, o direito estatal pode ser utilizado como suporte para as políticas de Estado pretendidas. Mas, mesmo tais aportes não são suficientes para calar as dissonâncias da alteridade, como ilustra a reverberação sonora das críticas mordazes ao universo jurídico por Carlos Malheiro Dias, que chegara a iniciar o curso de Direito na Universidade de Coimbra e, mesmo não tendo concluído, consegue transmitir um olhar repleto de peculiar sensibilidade em relação ao Direito.
Publicado
2016-05-06