A RECUSA DE LOCAÇÃO A CASAL HOMOAFETIVO SOB A PERSPECTIVA DA HORIZONTALIDADE DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NO BRASIL:

O EMBATE ENTRE A AUTONOMIA PRIVADA E O DIREITO DE NÃO SER DISCRIMINADO

  • Eduardo de Siqueira UNIBRASIL
  • Luiz Carlos UNIBRASIL/PPGD
  • Darlan
Palavras-chave: Horizontalidade dos Direitos Fundamentais. Direitos Fundamentais. Autonomia Privada. Direito de não ser discriminado.

Resumo

A autonomia privada tanto quanto o direito de não ser discriminado, encontram seu fundamento de validade no princípio da dignidade da pessoa humana. Na mesma esteira, ambas as garantias (autonomia privada e o direito de não ser discriminado) vêm implícitas no texto constitucional. A garantia da autonomia privada, já muito conhecida antes mesmo da atual Constituição brasileira, tem forte atuação nas relações contratuais privadas, ao passo que o direito de não ser discriminado emergiu recentemente, através das muitas garantias trazidas pela Constituição de 88. Apesar de o direito de o proprietário locar seu imóvel a quem melhor lhe aprouver decorrer diretamente da sua faculdade de uso e disposição da propriedade, a recusa da locação pela condição sexual do locatário parece ultrapassar os limites impostos pelo constituinte de 88, na medida em que, desconsiderando critérios objetivos, vale-se de subjetividades do indivíduo que, no decorrer da história, foram ressaltadas sempre na intenção de inferiorizar-lhe. A pertinência da controvérsia aqui apresentada justifica-se, portanto, na medida em que se mostra necessário (i) apresentar-se um exercício jurídico capaz de estipular a primazia de uma garantia em detrimento da outra, no caso concreto; (ii) a partir da utilização desse exercício, entender se há alguma violação de direitos fundamentais advinda da conduta do locador; e (ii) em havendo, quais direitos emergem ao locatário, a fim de ver tutelado seu direito de não ser discriminado por sua condição sexual. O objetivo do estudo não é outro senão a análise da colisão entre dois princípios válidos e vigentes, com vistas à teoria da horizontalidade dos direitos fundamentais. A discussão aqui levantada tem como base, fatos da vida cotidiana. Situações entre particulares que, num olhar menos desatento ao que chamou o Ministro Luiz Edson Fachin de “constitucionalização do direito civil”, podem não identificar violações a direitos fundamentais num “mero” negócio jurídico firmado entre atores privados. A partir da teoria da horizontalidade dos direitos começa-se a sustentar que, também nas relações interprivadas, houvesse de se observar os limites à autonomia privada, impostos pelos direitos fundamentais. Não há como se olvidar da inconstitucionalidade da conduta do locador que, ao valer-se de critérios discriminatórios não amparados pelo princípio da isonomia, viola direito subjetivo e fundamental do locatário que, ao ser discriminado e inferiorizado por condição sexual que lhe é intrínseca, tem violado o seu próprio direito de existir. Permitir que condutas discriminatórias em negócios jurídicos firmados entre particulares, sejam abalizadas pelo argumento da autonomia da vontade, culmina em permitir uma erosão que, pouco a pouco, poderá acabar por corroer todo um Estado Democrático de Direito.

Biografia do Autor

Luiz Carlos, UNIBRASIL/PPGD

Doutorando em Direito pela Unibrasil em Direitos Fundamentais e Democracia. Mestre em Direito pela Unibrasil em Direitos Fundamentais e Democracia. Bolsista PROSUP/CAPES. Especialista em Direito Tributário pela UniCuritiba. Especialista em Teoría Crítica de los Derechos Humanos pela Universidad Pablo de Olavide, UPO, Sevilla, Espanha. Advogado inscrito na OAB-Pr. sob. n.º 44.937. Professor da Uninter - Faculdade Internacional de Curitiba - da disciplina de Direito Empresarial e Direito Processual Tributário. Membro do Núcleo de Pesquisa em Direito Constitucional - NUPECONST do PPGD do Centro Universitário Autônomo do Brasil - UniBrasil/PR.

Darlan

Possui graduação em Direito pela Universidade Tuiuti do Paraná (2006). Foi funcionário da 4ª Vara da Fazenda Pública de Curitiba entre 1996 e 2005, ano em que foi foi nomeado Assessor de Gabinete, lotado na 10ª Câmara Cível do TJPR atuando até fevereiro 2014. Em março de 2014, prestou compromisso junto a OAB/PR, passando a exercer advocacia na área de responsabilidade civil, direito empresarial, negocial e trabalhista. Em 2017, foi convidado a compor a assessoria da 1ª Vice-Presidência do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, durante a gestão 2017/2018, exercendo o Cargo de Assessor Especial do 1º Vice-Presidente, atuando na gestão das Medidas Cautelares incidentais aos recursos especial e extraordinário e do sistema de precedentes dos Tribunais Superiores. Mestrando do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direitos Fundamentais e Democracia pelo Centro Universitário Autônomo do Brasil - UniBrasil/PR na linha de pesquisa Jurisdição e Democracia.

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Publicado
2021-11-18