ATIVISMO PROCEDIMENTAL: O STF COMO VÍTIMA, INVESTIGADOR, ACUSADOR E JUIZ NO MESMO PROCEDIMENTO

  • Henrique de Almeida Freire Gonçalves PPGD, Direito, Centro Universitário Autônomo do Brasil - UniBrasil
Palavras-chave: Ativismo judicial, Supremo Tribunal Federal, inquérito das “fake news”

Resumo

Recentemente, tem-se começado a falar em “ativismo judicial procedimental”: a invenção de regras procedimentais pelas cortes constitucionais para os seus próprios procedimentos. Um episódio recente no STF dá as dimensões de até onde pode chegar o fenômeno. Em março de 2019, o STF julgava a questão da competência para julgar processos em que políticos eram investigados, nos mesmos autos, por crimes comuns e eleitorais. O procurador Diego Castor, integrante da força-tarefa da lava-jato, disse que o STF estava ensaiando um golpe contra a operação. A partir da declaração, os ataques contra o Supremo se avolumaram nas redes sociais. Em um almoço no gabinete do presidente do STF, Luiz Fux externou sua indignação com os ataques que a corte vinha sofrendo. O presidente Dias Toffoli revelou que encaminhou ofícios à Polícia Federal pedindo que os ataques fossem investigados, mas nenhuma providência foi tomada. Fux afirmou durante o almoço, confirmado por Fachin, que o decano Celso de Mello – ausente do evento – se revoltara com os termos utilizados pelos procuradores da lava-jato, dizendo que as críticas haviam exorbitado a liberdade de expressão. Toffoli pensou em uma saída. Expôs sua ideia a Celso de Mello, que foi bem recebida pelo interlocutor. Depois, ligou para Alexandre de Moraes e disse: “Eu quero designar você, que entende disso”. No dia 14 de março, Toffoli abriu inquérito “contra tudo e contra quase todos”, como definiu um de seus assessores. Usou o dever genérico de velar pela intangibilidade das prerrogativas do STF e seus membros como justificativa para abrir um inquérito que seria conduzido no próprio tribunal, ao arrepio de uma série de normas de competência. Designou, sem sorteio, como ministro relator Alexandre de Moraes – a assessoria técnica do tribunal inabilitou todos os outros ministros para o recebimento da relatoria, deixando habilitado apenas Alexandre de Moraes antes de realizar o sorteio eletrônico com um nome só. Todos esses acontecimentos de bastidores foram relatados pelo livro “Os Onze”, de Felipe Recondo e Luiz Weber. O episódio é marcante pela sua heterodoxia, justificando um estudo aprofundado. O objetivo do estudo foi observar, na prática, a ocorrência do chamado “ativismo procedimental”, verificando como o STF cria procedimentos de modo a atingir objetivos pré-estabelecidos. O desenvolvimento da pesquisa se deu por revisão bibliográfica, sobretudo do livro “Os Onze”, que revela os bastidores do episódio. Concluiu-se que, de fato, o STF criou um procedimento para o caso, visando atingir um objetivo já sabido de antemão, e que o ativismo judicial é um fenômeno que abrange também a invenção de procedimentos ad hoc.
Publicado
2020-01-20