OS CONTORNOS DA NOVA CURATELA E SUA EXTENSÃO À LUZ DO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA

  • Beatriz Fracaro UniBrasil
Palavras-chave: curatela; direitos fundamentais; pessoa com deficiência.

Resumo

A Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência) promoveu profundas alterações na tradicional teoria das incapacidades prevista no Código Civil brasileiro de 2002, diante da plena capacidade legal da pessoa com deficiência, reconhecida pela Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. A fim de instituir um sistema de apoios ao exercício da capacidade legal, o legislador brasileiro inseriu no sistema jurídico pátrio o novel mecanismo da tomada de decisão apoiada, e manteve o instituto da curatela, porém conferindo-lhe nova roupagem. Desde então, as mudanças atinentes à curatela têm gerado divergências nos planos teórico e prático, suscitando questionamentos quanto a sua extensão e operacionalização. Surge para os juristas o desafio de interpretar o mecanismo da curatela a partir da perspectiva emancipatória do Estatuto, sem recorrer a atitudes discriminatórias ou paternalistas antes legitimadas pelo sistema. O presente estudo, utilizando-se do método dedutivo e do procedimento de pesquisa bibliográfico, tem por objetivo analisar a nova conformação da curatela, expondo as mudanças de caráter substancial e procedimental pelas quais passou, e, especialmente, investigar a adequação da limitação legal de sua extensão aos atos patrimoniais e negociais, tal como prevê o artigo 85 do Estatuto. Na prática, até o advento do Estatuto, notava-se uma banalização da curatela, decretada com base em exames periciais padronizados, e, via de regra, ignorando por completo as potencialidades e vontades do curatelado. Contudo, a curatela, até então vocacionada à tutela do patrimônio do incapaz, ganha um perfil funcionalizado a partir do Estatuto, que passa a caracterizá-la como medida humanizada, excepcional, temporária, e proporcional às necessidades e circunstâncias do caso concreto, cabível quando houver comprovação de que a pessoa se enquadra em uma das hipóteses do artigo 4º do Código Civil, reforçando a premissa de que a deficiência em si, ainda que mental ou intelectual, não é causa de incapacidade. Quanto à extensão da curatela, resta reconhecer que a complexidade intrínseca ao tema impõe que se rejeite qualquer tentativa de separação absoluta entre situações patrimoniais e existenciais, clamando por uma análise qualitativa em cada situação, levando-se em conta que a autonomia pode (e, em determinados casos, necessita) materializar-se mediante interferência de terceiro, mas não nos moldes do antigo modelo de substituição de vontade, e sim através do apoio, em que o curador deixa de ser mero gestor do patrimônio da pessoa curatelada, e passa a ter o dever de zelo pela sua proteção e, especialmente, pela sua promoção, em prol da plena inclusão.

Publicado
2021-06-11
Seção
Direito